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Channel: Vai Se Food, por Ailin Aleixo
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Petí Panamericana: um dos meus restaurantes favoritos ganha ‘irmão’ em cobertura

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Prato do novo Petí Panamericana: cupim braseado com purê de batata doce roxa, alface romana grelhada e tutano

Me tornei fã confessa do trabalho do jovem chef  Victor Dimitrow desde que ele abriu as portas de seu pequeno Petí, há dois anos, em Perdizes. Mesmo escondido, funcionando no salão dos fundos da loja de artigos artísticos de seu pai, o Petí não demorou para despontar como uma das joias da gastronomia da cidade, ganhar prêmios e atrair foodies. Criações de sabores equilibrados, cardápio dinâmico, doses sensatas de criatividade, belíssimo empratamento e excelente custo-benefício fizeram do restaurante um tremendo sucesso.

Balcão de saladas do Petí Panamericana: novas, saborosas e criativas opções, todos os dias

E foi esse êxito, unido ao forte vínculo com o mundo artístico, que motivou o convite da Escola Panamericana de Artes para que Victor instalasse unidades do Petí dentro das duas escolas (em ambas, sua família possui lojas). A primeira, que acaba de ser inaugurada, fica na Avenida Angélica, 1900. É o Petí Panamericana.

Entre as sugestões de pratos que mudam quinzenalmente, você pode encontrar esse frango com arroz caldoso, quiabo crocante e picles de semente de quiabo

Situado na agradabilíssima laje da escola (há quem prefira chamar de rooftop…), o novo Petí Panamericana tem salão claro, calmo e de decoração minimalista. Apesar da pegada gastronômica ser a mesma do Petí – cozinha contemporânea/brasileira/sazonal -, ali o esquema é bufê de saladas (para atrair e satisfazer a clientela de almoço da região) somado a prato principal. O valor? Ótimos R$ 39.

Peixe do dia (no caso, sororoca), moqueca de banana da terra com leite de coco do novo Petí Panamericana

Quando digo bufê de saladas, não visualize rúculas tristes ou deprimentes fatias de tomate: as receitas são originais, prazerosas e mudam todos os dias. Ali se pode encontrar, por exemplo, tartare de beterraba com molho de gema curada sobre torrada de pão de cacau 100%, homus de feijão fradinho e salada de quirera com legumes grelhados.

Salão do novo Petí Panamericana: agradabilíssimo rooftop/laje

O menu de principais traz seis opções, alteradas frequentemente, que podem incluir Peixe do dia (quando comi, foi sororoca) com moqueca de banana da terra no leite de coco, suculento cupim braseado com purê de batata doce roxa, alface romana grelhada e tutano, cubos de frango com arroz caldoso, quiabo crocante e picles de semente de quiabo e risoto de cevadinha com abóbora e picles de melão.

Creme brulê de café com pipoca e caramelo salgado: R$ 14 no Petí Panamericana

Sobremesas continuam sendo um dos fortes de Victor: sempre lindas, delicadas e não-óbvias. Prove o Cremoso de chocolate com cookie de manteiga de amendoim e cumaru e o creme brulê de café com pipoca e caramelo salgado (R$ 14, cada).

Por enquanto, só abre para almoço. Em breve, haverá brunch aos sábados.

Cremoso de chocolate com cookie de manteiga de amendoim e cumaru: Petí Panamericana

Para os alunos, ou quem tiver fome do meio da tarde, a lanchonete que funciona dentro da loja de produtos artísticos – ao lado do restaurante – serve, de manhã até a noite, pães de queijo, empanadas, sanduíches, bolos. Tudo feito ali.


Picadinho com farofa caipira

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Prato amado pelos paulistanos, o picadinho ganha companhia saborosa e sensacional no restaurante Micaela: farofa caipira, feita com farinha de milho e pimentões tostados. Para finalizar, fatias fritas de mandioca! Rende 2 porções.

Ingredientes
  • 300 gramas de mignon picado
  • 2 unidades de mandioquinha
  • 2 colheres de sopa de cebola e salsão brunoise
  • 2 dentes de alho amassado
  • 2 colheres de sopa de vinagre de vinho branco
  • 2 cravos
  • 5 colheres de sopa de shoyu
  • 2 conchas de caldo de legumes
  • Azeite a gosto
  • Ciboulette a gosto
  • Sal a gosto
  • Pimenta do reino a gosto
Como fazer

Tempere a carne com uma pitada de sal, pimenta do reino a gosto, o vinagre, o alho, o cravo.
Leve a uma frigideira bem quente com um fio de azeite sem mexer para que sele e não libere suco.
Acrescente a cebola e o salsão. Mexa, acrescente o shoyu e o caldo de legumes.
Deixe por alguns minutos para que incorpore.
Finalize com a ciboulette ou cheiro verde, se preferir, e sirva com o acompanhamento de sua preferência. Sugestão: chips de mandioquinha. Para prepará-lo, descasque a mandioquinha e com o mesmo descascador, continue tirando lascas finas no sentido longitudinal. Frite em óleo imersão a 180ºC e sirva por cima do picadinho.

Ingredientes da farofa caipira
  • 400 grs de farinha de milho de qualidade
  • 2 colheres (sopa) bem cheias de vinagrete feito à sua moda
  • 2 colheres (sopa) de escalivada (pimentões 3 cores tostados direto na chama do fogão, retiradas as peles e picados)
  • 2 colheres (sopa) de ciboulette ou cebolinha picadas
  • 1 colher (sopa) de azeitona preta (azapa) bem picada
Como fazer

Junte os ingredientes e incorpore a farinha. Está pronta essa deliciosa combinação para carnes.

Uma arrebatadora e deliciosa imersão siciliana, parte 2: Taormina

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eatro grego de Taormina: a edificação mais sensacional em que já estive, por duas vezes (e já fui ao Coliseu, Mesquita Azul, Santa Sofia, Notre Dame…). Que sorte.
Construído no século 3 A.C.

Situada no alto de uma colina cercada por primaveras e cactus, à beira do mar Jônico, Taormina é o destino mais visitado da Sicília. No verão, sua população aumenta em até 400% (no inverno, metade dos hoteis e restaurantes fecham as portas por conta dos ventos gélidos que afastam aves e turistas). A razão pela qual tanta gente vai para lá durante os meses de maio, junho, julho e agosto? Simples: Taormina é deslumbrante.

A vida em pausa nas praias de Taormina

Praias calmas, mar azulaço, vista magnífica para o Etna, dos mais bem preservados Teatros Gregos da Europa, sol, lojas, coquetéis. Taormina é, mesmo, um destino obrigatório para quem viaja pela Sicília. Mas ao contrário de outros cantos da ilha, Taormina é cara: hospedagem e comida custam cerca de 40% mais do que em qualquer outra cidade siciliana. Também tem pega-turista, aquele tipo de estabelecimento que tem cara de bacaninha, serviço simpático e comida… cara e medíocre. Mas não desanime: os bônus são muuuuuito maiores do que os ônus.

As lindas e solares cerâmicas de Taormina

Como aluguei um apartamento, acabei cozinhando bastante, o que me afastou de desastres gastronômicos e me deu tempo para pesquisar locais que realmente valham a pena. O resultado está na pequena- porém bem boa – lista abaixo.

Praça central de Taormina à noite

Cannolo: Roberto Il Mago Dei Cannoli

O CANNOLO DO ROBERTO! Em Taormina, JAMAIS deixe de comer

Ícone siciliano, o cannolo (cannoli, no plural) é onipresente de biboca de rua à restaurantão estrelado. Contudo, de todos os que comi no Brasil e na Itália, jamais provei um tão estupendo como o do Roberto, justamente auto-denominado, “Mago dos cannoli”.

A doceria do Roberto: o melhor cannolo do universo ‘mora’ em Taormina

As massas, feitas diariamente, são maravilhosamente crocantes e leves: me disse o Roberto que essa textura divina é resultado do uso de vinho tinto avinagrado na receita. O recheio – ricota, etérea e imaculadamente branca, batida a mão com açúcar – é colocado apenas na hora do pedido, para não amolecer o canudo. Para finalizar, açúcar de confeiteiro peneirado.

Surreal de bom.

Cascas de laranja confitadas e mergulhadas no chocolate amargo do Roberto, Il Mago dei Cannoli, em Taormina

Outro doce dali que eu também poderia comer baldes é bem tradicional da região: cascas de laranjas confitadas e mergulhadas no chocolate amargo.

Fiquei quase uma semana em Taormina e batia ponto diariamente no Roberto.

Granita: BamBar 

Granita do BamBar: uma instituição siciliana

BamBar é uma instituição da cidade: segundo dezenas de guias e clientes, é lá que se serve e produz a melhor granita da Sicília. Granita é feita de gelo, suco de fruta e açúcar misturados de maneira a gerarem um resultado cremoso e ainda manter uma certa granulação. Viciante.

Os sabores são sazonais, então torça para ter de framboesa e pistache. Ah, não fique em dúvida: peça com ‘panna’, creme tão leve e sedoso que dá vontade de enfiar a cara.

Pastas e peixes: Osteria RossoDiVino

Espaguete com ouriço do mar e botarga da Osteria RossoDivino, em Taormina: de chorar no colo de Poseidon de tão bom

Saia um pouco do buchicho turístico da região em torno da avenida principal – a Corso Umberto I – e vá a uma osteria com comida boa de verdade, ambiente agradabilíssimo e preços coerentes. O foco, como em toda a ilha, são os peixes e frutos do mar. Sempre frescos, sazonais, pujantes e pescados no dia, são um sopro marítimo de prazer. Cardápio conciso e bem executado com delícias como o Espaguete com ouriço do mar e botarga (22 euros) e nhoque com ragu de peixe alla siciliana (19 euros).

Pizza: Vila Zuccaro

Pizza de prosciutto, tomate seco (como deve ser, ainda suculento!) e queijo de cabra na Vila Zuccaro, em Taormina

A Vila Zuccaro faz um estilo de pizza que lembra a paulistana em textura (porém a massa passa por longa fermentação) – mais pra grossa, pedaços crocantes na borda e macios no interior –  e usa insumos de qualidade nas coberturas. É preparada num forno à gás, de plataforma giratória – para assar por igual – e custa cerca de 10 euros, cada. O belo pátio é outro bom motivo para jantar por lá, especialmente se você refrescar a noite com um bom vinho branco (prove a uva regional Catarrato) ou cerveja artesanal local.

Picolés 100% naturais: Gelaterie Stecco Natura

Picolés 100% naturais da Stecco Natura

Fico feliz em ver empreendimentos assim se tornarem redes: insumos 100% naturais, nada de corantes, conservantes, espessantes ou pasta base. Os picolés são coloridos, cheirosos, refrescantes e causam um certo vício (por que são uma arma e tanto para aplacar o calor).

Drinques com vista pro Etna: Belmond Grand Hotel Timeo

No bar do Belmond Grand Hotel Timeo, em Taormina, a vista é apenas sensacional

Deslumbrante, de embasbacar, chocate: assim é a vista do bar do lindíssimo Grand Hotel Timeo. Enquanto você dá pequenos goles nos bem feitos coquetéis – prove o Etna Spritz, que leva campari, amaro siciliano a base de laranja sanguínea e champanhe (26 euros) -, à sua frente estão o mar, o Etna e o pôr-do-sol. E, claro, uns petiscos: amo amo amo esse hábito italiano de trazer comida, de graça, assim que se pede a bebida durante o aperitivo (americanos chamariam de happy hour).

Drinques nas escadarias: Daiquiri

Drinques e petiscos (que vem, de graça, quando se pede bebidas – em toda a Sicília e boa parte da Itália) do Daiquiri, em Taormina: excelente para observar o movimento da rua e curtir a cidade

Chegue cedo, pegue seu lugar num dos degraus da escadaria em frente ao bar, relaxe, peça um coquetel e fique observando o movimento das pessoas, o cair da luz do dia, o aumentar da música ambiente. Excelente local para um esquenta antes do jantar.

Fitó: cozinha do Piauí reverenciada com sutileza

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Paçoca de carne de sol, baião de dois, tartar de banana e queijo coalho do Fitó: R$ 27

Clima duro, ingredientes limitados, poucas verduras e legumes, muita proteína animal e raízes para garantir a força para enfrentar o dia: a comida do árido e semiárido nordestinos é forte, calórica. Mas no novo Fitó – casa dedicada a receitas de família do Piauí -, a cozinheira e sócia, Cafira Foz, conseguiu imprimir grande sutileza a pratos geralmente potentes como paçoca de carne de sol que, em sua versão, leva manteiga de garrafa apenas para dar umidade e liga entre os finos fios de carne e a boa farinha de mandioca. É acompanhada por delicado baião de dois, tartar de banana, queijo coalho grelhado e cubinhos de tomate que emprestam frescor. O preço é tão bom quanto a comida servida: R$ 29.

Ambiente do Fitó: claro, espaçoso, moderno e agradável

Ao lado do Mercado de Pinheiros (Mocotó, Napoli Centrale, Comedoria Gonzales), Pitico, MicaMaria Farinha, entre outros, o Fitó vem reforçar as boas opções gastronômicas da região do Largo da Batata. Assim como em seus vizinhos, no Fitó come-se bem e paga-se pouco, especialmente quando se compara a outras regiões da cidade.

Bolinhos de costela de porco com geleia de pimenta do Fitó

O menu conciso conta com seis pratos fixos – entre eles, o suculento Assado de coxa e sobrecoxa de frango caipira marinadas no tucupi preto, redução de cajá, couve refogada e batata doce no forno (R$ 25) e a Peixada no caldo com camarão, pimentão, tomate, leite de coco feito na casa e dendê, escoltada por arroz, farofa e abacaxi (R$ 45) – e algumas entradinhas. Vale pedir os bolinhos de costela de porco (R$ 12, 6 unidades), fartos em carnes e de fritura sequinha.

Rústico, bem feito e saboroso: frango caipira assado com tucupi preto, salada e batata doce no forno

Para cada dia da semana há sugestões fixas de pratos. Segundas, Maria Isabel (arroz com carne de sol, mandioca cozida e vinagrete de tomate, R$ 25); terças, Carne de panela (R$25); quartas, costela de porco com legumes (R$ 25); quintas, frango ao leite de coco e arroz com quiabo (R$ 25); sextas, tambaqui empanado na tapioca com vinagrete de feijão fradinho (R$ 25); sábados, pernil de cordeiro cozido no leite de coco, cuscuz de milho e legumes (R$ 39).

Às segundas, no Fitó, o prato do dia é Maria Isabel (arroz com carne de sol, mandioca cozida e vinagrete de tomate, R$ 25

O mesmo cuidado empregado na cozinha nota-se no bar. Neles são preparados não só drinques como também sodas e refrescos artesanais, a exemplo do Sossega Lampião (maracujá, mel de camomila e água com gás) e da gengibirra (fermentado de gengibre com limão). Os coquetéis mantém a alma nordestina, usando ingredientes emblemáticos como a cajuína, que entra na composição do Cajuína Sour ao lado de cachaça, limão e aquafaba, um derivado viscoso do cozimento do grão de bico que faz as vezes da clara (R$ 23). O caju, transformado em bebida fermentada e misturado a Jack Daniels, espuma de gengibre e raspas de amburana (R$ 23) compõe o Cabeça de Cuia.

Flan de coco do Fitó: uma joia

De sobremesa, peça o Flan de Coco (R$ 6).: crocante embaixo, cremoso em cima, pouco doce. Dá um afago na alma. Há também Bolo de chocolate belga (por que não chocolate brasileiro, já que temos ótimas opções?!) com calda de cupuaçu (R$ 16).

Manjar branco de cupuaçu com calda de rapadura

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Sobremesa brasileiríssima, fácil de preparar e deliciosa! Receita do restaurante Micaela, em São Paulo.

Ingredientes manjar branco
  • 1 caixa de leite condensado
  • 2 ½ de leite (usar a caixa de leite condensado como medida)
  • 1 xícara de amido de milho
  • 200 ml de leite de coco
  • 250 g de cupuaçu
Como fazer

Misture todos os ingredientes e bata no liquidificador. Em seguida leve ao fogo e mexa até atingir a textura firme do manjar. Bata novamente e coloque nas forminhas. Assim que esfriar, leve para geladeira até firmar.

Ingredientes da calda
  • 100 g de rapadura
  • 50 ml de água
  • Suco de dois limões cravos
  • 1/2 semente de cumarú
Como fazer

Derreta a rapadura em fogo médio e acrescente o restante dos ingredientes. Em fogo bem baixo, durante alguns minutos, deixe incorporar todo o sabor. Sirva por cima do manjar geladinho.

Frangos: a realidade da criação no Brasil

Frangos: o real cenário de criação no Brasil (não, não tem hormônios – mas tem antibióticos…)

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Não tão ruim quanto esperava; não tão bom quanto gostaria.

Essa foi minha conclusão após passar dois dias em alguns aviários e unidade de processamento da Seara, em Santa Catarina, e checar – de perto, sem restrições – a criação, o transporte dos animais vivos, o abate, o desmembramento e embalamento.

Já aviso: este texto é bem longo.

Meu desejo de acompanhar a produção de aves da grande indústria brasileira vem de longe – tantas eram as perguntas: é verdade que se usa hormônio? As galinhas vivem 24 horas por dia sob luz para comer mais? – mas se intensificou de forma gritante ao ver, ano passado, dois nomões da gastronomia assinarem embaixo das gigantes do mercado, no Seara e Sadia. Alex Atala não me causou tanto estranhamento visto seu histórico de campanhas publicitárias (caldo pronto, café de qualidade aquém da mediana). Mas Jamie Oliver? Opa, esse me chocou.

Granja da Seara em Guaraciaba, Santa Catarina

Granja da Seara em Guaraciaba, Santa Catarina

O cara que sempre admirei por ter construído um império baseado em estimular as pessoas a conhecerem o que comem, a cozinharem, a evitarem as áreas de “empacotados” do mercado em prol dos corredores de verduras, frutas e legumes?
Que conseguiu mudar o menu do McDonald’s do Reino Unido?
Que luta contra a obesidade infantil, resultado do aumento desenfreado do consumo de “alimentos” e refrigerantes de gigantes multinacionais?
Que sempre valorizou pequenos produtores e a cultura gastronômica de cada região, de cada país?
Que defende a comida fresca?
Como ESSE homem assina uma linha de congelados para a mesma empresa que fabrica presunto com proteína de soja e entope boa parte de seus produtos com corantes, antiumectantes, conservantes e realçadores de sabor – e que ainda tem a cara de pau de carregar o slogan “Deliciosamente Saudável”?
Não por dinheiro – ja é milionário.
Não por ingenuidade, certamente: ele sabe muito bem que associar-se ao nome Sadia o atrelará, diretamente, a TODO o portfólio da marca e não somente aos seus frangos com “melhores padrões de bem estar animal”. E foi exatamente por isso que a empresa jogou um caminhão de dinheiro nessa parceria…
Jamie Oliver topou, muito provavelmente, pela grana preta investida pela marca em seu projeto FoodRevolution, que tem como objetivo levar consciência e educação alimentar para as escolas: mas dá mesmo para fazer revolução alimentar bancada pela indústria que lucra com gente comendo nuggets e apresuntado, e não brócolis, maçã ou arroz com feijão feito em casa? Hum, sei não.

Há cerca de um ano, Jamie Oliver veio ao Brasil exclusivamente para lançar sua parceria com Sadia: pratos congelados com carne de frango que terão que ser finalizados pelo comprador, o que a empresa e o chef parecem considerar enquadrar-se na categoria ‘cozinhar’ (“consumidores terão que aquecer molhos, assar ou mesmo selar a carne”, diz press release). Estive em sua coletiva de imprensa, em São Paulo: mais parecia um coquetel regado a conversas amenas. Curiosamente, não consegui emplacar as minhas questões, mesmo meu braço estando levantado a maior parte do tempo. Então enviei questionário para a assessoria de imprensa da marca, que demorou dez dias para devolvê-lo respondido. Você pode lê-lo completo AQUI.

Sentada ali, na frente de um Jamie Oliver visivelmente na defensiva, ficava mais e mais abismada diante de frases ditas por ele, que me soavam um tanto esquizofrênicas:
“Os maiores problemas do planeta em relação a alimentação são a fome, a obesidade e a resistência humana e animal a antibióticos” (mas conforme você pode ler no link do meu questionário, antibióticos podem ser usados nas aves da linha Jamie Oliver!) e
“É necessário trabalhar com grandes companhias para fazer grandes mudanças”.

Vista externa de aviários parceiros da Seara, em Guaraciaba, Santa Catarina

Vista externa de aviários parceiros da Seara, em Guaraciaba, Santa Catarina

Jura, Jamie Oliver? Posso te contar uma coisa: as grandes mudanças só ocorrem pela união dos PEQUENOS.
Só estamos assistindo o crescimento da oferta de orgânicos, por exemplo, porque cada cidadão que começa a consumi-los, seja por focar na saúde individual e/ou do planeta, estimula um agricultor a abandonar a agricultura convencional.
Só temos melhora nos padrões de bem estar animal porque as pessoas ‘comuns’ começam a se negar a consumir carnes, ovos e leites provenientes de criações insalubres.
Só vivemos em um tempo no qual megaempresas precisam fazer campanhas milionárias esclarecendo COMO produzem alimentos porque cada cidadão com poder de escolha e compra as pressiona para maior transparência. Grandes corporações não fazem grandes mudanças em prol dos pequenos, Jamie Oliver. Em prol do bem global. Grandes corporações só fazem mudanças porque precisam manter o lucro – e sabem muito bem com quem se associar para tal fim. Como disse Elisabetta Recine, coordenadora do Observatório de Segurança Alimentar e Políticas de Nutrição e professora de Nutrição da Universidade de Brasília, a um jornal inglês: “Jamie Oliver não fará a Sadia melhor, mas certamente a Sadia fará Jamie Oliver pior“.

Ainda estou esperando a resposta da Sadia ao meu pedido para conhecer suas granjas. A Seara atendeu-o prontamente, mesmo com todas as minhas exigências para que a visita fosse realizada: precisaria ser em uma granja padrão, mostrada na campanha publicitária; acesso irrestrito a todas as áreas; todas as questões respondidas por especialistas. E para minha surpresa, ninguém fugiu de questionamento algum. Meses depois, visitei um produtor sustentável e orgânico, a Korin, que rendeu reportagem que pode ser lida AQUI.

Para os odiadores profissionais, aviso: não foi excursão à Coreia do Norte. Não rolou – como um sem noção sugeriu no Facebook – granja maquiada especialmente para a minha visita: é estruturalmente inviável mover dezenas de milhares de galinhas para causar efeito positivo em UMA jornalista. O fato é: o que vi é a realidade cotidiana do setor. E, finalmente, tive minhas questões respondidas.

Aos que questionarem a razão de não haver fotos de outras partes do processo: é proibido por questões de segredo de indústria (tipo de maquinário e de linha de produção) e também para preservar a privacidade dos funcionários. Não gostei nada, claro – desejava mostrar tudo aqui – mas há que se seguir certas regras para tornar o trabalho possível.

Galinhas e frangos para corte em granja padrão da Seara

Galinhas e frangos para corte em granja padrão da Seara

Eis alguns dados sobre a produção de carne de frango no Brasil:

As empresas são proprietárias de todos os aviários?

Não. Elas trabalham no esquema de fornecimento de infraestrutura para milhares de pequenos e médios criadores: construção dos aviários, entrega de pintinhos, treinamento de pessoal, ração, vacinas, logística de transporte dos animais vivos para os abatedouros (estes, sim, próprios). Cada um deles assina contrato se comprometendo a seguir todas as regras preestabelecidas de criação e bem-estar anima em troca da compra total do lote de aves.

Hoje, no Brasil, a Seara mantém cerca de 9300 proprietários rurais cadastrados, o que soma 140 milhões de galinhas nos aviários. A marca é a maior exportadora brasileira da proteína, atendendo 150 países.

Quantas galinhas/frangos vivem por metro quadrado?

O adensamento médio é de 32 quilos por metro quadrado. Levando-se em conta que cada galinha atinge cerca de 1600 gramas, temos cerca de 20 aves por metro quadrado.

Não, não é lindo de se ver. Não é a cena idílica da criação caipira, com as galinhazinhas bicando o chão e comendo minhocas. A realidade: imensos galpões com temperatura e umidade controladas, nos quais entra luz solar apenas quando o clima externo está bom o suficiente para não jogar excesso de ar quente ou frio para dentro.

As aves comem, dormem e evacuam. Só. Não há poleiros – parte do comportamento natural das aves é se empoleirar – e todas ficam no mesmo nível, o tempo todo, sobre o que é chamado de cama de frango. Formada por casca de arroz, bagaço de cana, sabugo de milho e outros materiais vegetais, a cama de frango recebe os dejetos das aves, bem como os restos de ração que caem no chão. A cada ciclo de criação – cerca de 40 dias – ela é trocada. A antiga passa por processo de compostagem e vira adubo.

A criação brasileira de aves é considerada uma das melhores do mundo – tanto em bem estar animal quanto em leis sanitárias – e é, sem dúvida, consideravelmente melhor do que a americana (clique AQUI para ter uma ideia) e a da Comunidade Europeia, que permite adensamento de 42 quilos por metro quadrado.

Todas as aves tomam antibióticos e hormônios?

Hormônios são proibidos no Brasil, tanto para aves quanto para bois, suínos, ovelhas, cabras. Não há a possibilidade de nenhuma empresa LEGAL oferecer hormônios para animais de corte sem sofrer punições gravíssimas do MAPA (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento).

Agora, quanto a antibióticos… Sim, são legais. Contudo, seu uso vem decrescendo na última década. A razão é simples: o mercado externo – e agora também o interno – vê com péssimos olhos o aumento gritante da resistência humana e animal a antibióticos, justamente por conta do seu uso descontrolado. Super bactérias estão nascendo, levando a morte milhares de humanos e animais, todos os anos. Uma das grandes causas disto é… nossa comida, especialmente bois e aves.

Outros pontos que levam à diminuição do uso de antibióticos no Brasil: o alto valor da medicação; a melhora no bem-estar animal, que faz a vida dos bichos ser menos estressante, causando menos doenças, gerando menos necessidade de medição. Hoje em dia, simplesmente não fecharia a conta entupir galinhas de antibióticos porque a) o preço final do produtos seria bem maior e b) muitos países imporiam barreiras a importação, o que acarreta queda no faturamento (tendo em vista que mais de metade das vendas de aves da Seara é destinada a exportação, imagine o tamanho do problema).

Nos aviários que visitei, a média de uso de antibióticos nos ciclos mais recentes é de 1 galinha em cada 140. Mas é bom deixar claro que isso não traduz a realidade de todos. Muitos muitos muitos produtores ‘escondem’ os antibióticos por detrás dos termos ‘melhoradores de desempenho’ e ‘promotores de crescimento’.

Do que se alimentam?

Cerca de 70% da ração – servida à vontade – é composta por farinha de grãos como milho, trigo e soja. Claro, todos transgênicos e entupidos de pesticidas: o Brasil é o campeão mundial no uso de agrotóxicos. O que há nos outros 30%? Bom, aí a coisa complica… Há farinha de carne e ossos bovinos, por exemplo. Ao ver minha surpresa horrorizada com o fato, um dos funcionários da Seara fez questão de me lembrar que aves são onívora. Eu fiz questão de lembrá-lo que em nenhum momento da evolução galinhas comeram vacas… e que minhocas e insetos são ligeiramente diferentes de boi.

Contudo, acabemos com a lenda urbana de que há farinha de pintinhos mortos na ração das galinhas: não há. Bem porque foi algo parecido que desencadeou a doença da vaca louca – e ter um escândalo de proporções planetárias não é o que a indústria almeja.

Outra lenda urbana que vai pro ralo: não existe injeção de realçador de sabor nas aves.

As aves vivem sob luz 24 horas por dias para comerem mais e engordarem mais rápido?

Não. Pelo menos na que visitei, as luzes da granja são apagadas perto das 23hs e “acesas” na hora do nascer do sol.

O aquecimento – para o qual as lâmpadas também servem – é feito via injeção de ar quente no recinto. Esse ar quente é gerado em caldeira alimentada com madeira de reflorestamento.  De novo, nas granjas que visitei: não tenho como saber e averiguar os processos cotidianos de todas.

Quanto tempo vive uma ave até ser abatida?

Os pintinhos chegam com um dia de vida ao aviário e permanecem ali até o trigésimo nono dia. Então, seguem para o abate. O aviário é limpo, a cama de frango é trocada e uma nova leva chega.

O que se faz com os ovos que as galinhas botam?

As galinhas não botam ovos nas granjas de corte porque não chegam a atingir a idade fértil para tal. Funciona assim:
– as “avós” (galinhas geneticamente selecionados) são importados dos EUA e da Inglaterra e ficam em granjas específicas até 25 semanas de vida, quanto estão prontas para reproduzir. Daí são enviadas para outro aviário para acasalar com galos selecionados.
– os ovos seguem para outra unidade (os incubatórios), na qual permanecem em ambiente de condições controladas. Após 21 dias, eclodem e, imediatamente, os pintinhos são levados para aviários voltados para o abate.

Há muita mortandade no transporte dos animais vivos até o abatedouro?

Há mortalidade, claro. Mas, de novo, não seria financeiramente interessante se houvesse muita. Todo o processo de transporte é rastreado via satélite e agendado para ter o menor tempo possível entre a colocação das aves nas caixas e seu abate – o que não quer dizer que seja bacanão, afinal os animais ficam apinhados em caixas cheias, a mercê do clima, o que está longe de ser o ideal. A razão do tempo curto transporte-abate: diversas pesquisas indicam que quanto menor for esse intervalo, e menos estresse animal houver, melhor será a qualidade da carne.

Para saber mais sobre o assunto, conheça a comissão de bem-estar anima do MAPA clicando AQUI.

Como é o abate?

Não existe matar galinha com espuma tóxica: taí outra lenda urbana. Essa prática só rola quando um lote de aves é infectado por doenças contagiosas, como a gripe aviária, e precisa ser esterilizado. A única maneira legal no Brasil para se abater aves é a desensibilização por corrente elétrica, como você pode ler AQUI.

As aves são penduradas em ganchos, pelos pés, e tem a cabeça mergulhada em água pela qual passa corrente elétrica alta suficiente para desacordá-la e baixa o bastante para não causar danos irreversíveis (hematomas ou morte). “Desmaiada”, tem o pescoço cortado, segue para a sangria, para a depenagem em água fervendo e para a retirada dos órgãos internos por uma mão mecânica.

Cada carcaça – com seus devidos orgãos colocados logo acima delas, numa grande linha de produção circular – é verificada por funcionários do SIF (Serviço de Inspeção Federal, órgão do Ministério da Agricultura), que procuram por sinais de bile, doenças e anomalias. Em cada fábrica há uma área demarcada para estes funcionários, com os quais os proprietários (Sadia, Seara, etc) não podem interagir – a única pessoa autorizada a fazer a interface entre o SIF e a granja é um supervisor. A medida foi estabelecida como maneira de evitar possíveis fraudes e subornos.

O que se faz com toda a pena e sangue gerados no abate?

Aqui o negócio não é bonito, não. Nada bonito.

O plasma do sangue é comprado pela indústria alimentícia – inclusive a de comida hospitalar – e de ração para animais domésticos como palatabilizante, ou seja, para tornar os sabores mais vivos.
Plasma é o produto obtido do sangue fresco integral, seco por pulverização (spray-drying), o qual foi previamente separado de suas células vermelhas e brancas por meio de processo químico e mecânico. A proteína contida no plasma é formada principalmente por albumina, globulina e fibrinogênio. O resto do sangue é seco e vai parar… em ração de animais, tanto de estimação quanto de corte (caso do porco).

As penas são transformadas em farinha e seguem para a indústria de ração de animais domésticos e de… peixes.

Para saber mais sobre o tema, clique AQUI

Há diferença na criação de animais para consumo interno e exportação?

Não: toda a criação e processamento são unificados. Assim que as aves são desmembradas, suas partes passam por supercongelamento e seguem para mercados distintos, com perfis diferentes de consumo. O Japão, por exemplo, compra a maior parte da pele; a China, os pés.

Os maiores compradores de frango brasileiro são a Arábia Saudita, o Japão e a China. Cerca de 40% da carne exportada no mundo tem origem no Brasil e em 2018/2019, as exportações de carne de frango deverão representar 90% do comércio mundial.

Qual é o número de aves abatidas por dia?

É chocante a quantidade de proteína animal que se consome no mundo, além de ser algo totalmente insustentável: não há recursos naturais suficientes para suprir o apetite crescente por carne, queijo e ovos. Se, atualmente, mais de 1/3 dos grãos produzidos no mundo já vão para alimentação animal (imagine a quantidade de terra, de água, de pesticidas!), tente vislumbrar o cenário caso todos os habitante do globo queiram comer carne como brasileiros ou americanos. Seria o colapso ambiental. Querendo saber mais, dê uma olhada AQUI

Estes números do mercado de aves me deixaram boquiaberta:

–  5.600.000 aves abatidas por dia no Brasil – isso contando APENAS A SEARA
– 450 milhões de aves abatidas por mês no Brasil – total da indústria
– 140 milhões de frangos alojados nos aviários parceiros da Seara
– Brasileiro médio consome cerca de 50 quilos/ano
– Em 2015 foram processadas 13,146 milhões de toneladas de frango no Brasil

Quer dizer que a Seara é fofa e linda, por isso abriu a produção para visita?

Não, é apenas uma empresa que entende o óbvio: não dá mais pra omitir ou mentir para o consumidor. As corporações podem até apostar na vitória da ignorância ou da publicidade truqueira, mas o fato é que cada vez mais gente quer a verdade e irá atrás dela.

Se há espaço para melhora? Opa, e como. Quem determinará o quanto, e a que velocidade, somos nós, os consumidores.

CLIQUE AQUI PARA LER SOBRE A CRIAÇÃO ORGÂNICA E SEM ANTIBIÓTICOS

Veggie Raw Burger: porque ‘hambúrguer’ vegetariano pode, e deve, ser delicioso

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Beet n avocado crush do Veggie Raw Burger: burger de beterraba e trigo sarraceno, mussarela, avocado, crisp de alho poró e maionese no brioche com amêndoas (R$ 25)

É reconfortante encontrar chefs/estabelecimentos que tratam legumes, verduras, tubérculos e cogumelos como protagonistas: as possibilidades do reino vegetal são vastíssimas e, ainda, pessimamente exploradas no Brasil: neste país carnívoro, há uma certa preguiça e/ou desdém por parte de cozinheiros em estudar e criar receitas plant based, como se carne fosse item essencial a uma refeição ‘de verdade’. Nada mais equivocado, ecologicamente bizarro e antiquado do que esse pensamento (se você se interessa pelo tema, clique AQUI)…

bolinhos de espinafre com ricota e chia acompanhados por pesto de hortelã: entrada crocante e cremosa do Veggie Raw Burger

E é esse raro capricho com o reino vegetal  o que se prova no novo Veggie Raw Burger. A casa de decoração moderna, instalada num pátio na Rua Augusta (ao lado do HiPokee), é irmã da unidade Vila Madalena, voltada a hambúrgueres tradicionais. Na Veggie Raw, entretanto, o cardápio é 100% dedicado a hambúrgueres vegetarianos. Se você odeia unir as palavras ‘hambúrguer’ e ‘vegetariano’, ok, digo que é uma lanchonete com deliciosos sanduíches sem uso de carne.

Quinoa Cowboy, do Veggie Raw Burger: burger de quinoa e nozes, coalhada seca, pesto de hortelã no pão de beterraba (R$ 25)

São seis opções de hambúrgueres com receitas bem elaboradas e resultados excelentes (tanto em sabor quanto em textura), ótimos pães, mix criativos e, aleluia!, livres da maldita proteína de soja, odioso curinga da velha culinária vegetariana.

Excelentes batatas fritas do Veggie Raw Burger

Meu preferido (provei quase todos) é o Mushies and Buschies: pão de cerveja stout, burger de cogumelos e batata, cogumelos grelhados, mussarela, broto de alfafa e maionese de limão siciliano (R$ 29). Mais leve e sutil, o Quinoa Cowboy leva burger de quinoa e nozes, coalhada seca e pesto de hortelã no pão de beterraba (R$ 25).

Mushies and Buschies, meu favorito no Veggie Raw Burger: pão de cerveja stout, burger de cogumelos e batata, cogumelos grelhados, mussarela, broto de alfafa e maionese de limão siciliano

Inusitado, estranho na primeira mordida e curiosamente viciante nas seguintes, o Wasabi Garden é composto por burger de berinjela e biomassa de banana verde, queijo prato, nori, picles de gengibre e maionese no levemente picante pão de wasabi (R$ 25).

Salões interno e externo do Veggie Raw Burger: na mesma ‘vila’ do HiPokee

De pegada mais potente e terroso, o Beet n Avocado Crush une burger de beterraba e trigo sarraceno, mussarela, fatias de avocado, crisp de alho poró e maionese no brioche com amêndoas (R$ 25).

 

O queijo nem faz falta diante desse palitos de abobrinhas empanados no panko e na cerveja: no interior, super cremosos e quentinhos

As entradas são tão bem pensadas e executadas quanto os burgers, especialmente os bolinhos de espinafre com ricota e chia acompanhados por pesto de hortelã (R$ 19) – tão cremosos por dentro que lembram as croquetas espanholas -, as finas, longas e crocantes batatas raw (R$ 12) e os palitos de abobrinha que, sem casca, são empanados em panko e cerveja (R$ 16).

Wasabi Garden, do Veggie Raw Burger: burger de berinjela e biomassa de banana verde, queijo prato, nori, picles de gengibre e maionese no pão de wasabi

Tanto o Raw Burger quanto o Veggie Raw tem pegada de bar e jogam forte nas gin tônicas, com carta dedicada a elas. A variedade de rótulos inclui Gin Mare (R$ 59), Apostoles (R$ 42), The Botanist (R$ 42) e Hendricks (R$ 42), entre outros.

Delícia de tortinha raw vegana com cacau 100% e base de tâmara e amêndoas do Veggie Raw Burger, na Rua Augusta

Nada light – muita gente confunde comida vegetariana com pouco calórica, conceitos que não tem relação nenhuma entre si -, a  Torta crua com base de tâmara e amêndoas e recheio de óleo de coco, cacau 100%, mel e flor de sal (R$ 15), da Weeds&Seeds, é ridiculamente gostosa. Se não curte – mas deveria, pelo menos, provar! -, vá de pudim de leite (R$ 6).

Por mais bares, restaurantes e lanchonetes sem carne e com muito, muito sabor.


Uma arrebatadora e deliciosa imersão siciliana, parte 3: Belmond Grand Hotel Timeo

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Terraço do Grand Hotel Timeo, em Taormina: ao fundo, o mar Jônico e o imponente vulcão Etna

Há bons hotéis, hotéis sensacionais e hotéis inesquecíveis. O Belmond Grand Hotel Timeo, em Taormina, na Sicília, não só entra na última categoria como a eleva a outro patamar, a dos hotéis que penetram no nosso inconsciente e ficam para sempre fazendo aparições em nossos sonhos.

Vista da praia que banha o Belmond Villa Sant’Andrea: quem se hospeda no Timeo, tem transfer e praia praticamente particular

No bar do Belmond Grand Hotel Timeo, em Taormina, a vista é apenas sensacional

Lá comemorei meus 41 anos: uma noite e um dia de contemplação em companhia do meu marido, do Etna e do mar Jônico. Por-do-sol multicor, silêncio. Café da manhã na varanda do quarto, drinques de fim de tarde no páteo – aliás, tomar alguns coquetéis por ali é programa indispensável para quem vai a Taormina, mesmo não sendo hóspede, tanto pela qualidade da coquetelaria quando pelo visual de embasbacar.

Café da manhã do meu aniversário de 41 anos: na varanda do meu quarto no Grand Hotel Timeo

Restaurante ‘al fresco’ do Belmond Vila Sant’Andrea

Já me hospedei em alguns hotéis da rede Belmond pelo mundo e sempre, sempre, sempre tive experiências absurdamente prazerosas. Porém, confesso, o Timeo tem algo tão especial que chega a ser impalpável. É mais do que luxo, atendimento impecável, boa comida, localização deslumbrante: é uma aura de paz que faz parecer que o mundo tem sentido.

Sobremesa do meu jantar de aniversário: cinco texturas de chocolate

Outro ponto fortíssimo do Grand Hotel Timeo: a gastronomia. Aqui, Linguine com lagosta e tomatinhos locais

Localizado na parte alta de Taormina, bem ao lado do deslumbrante Teatro Grego (há, inclusive, uma passagem secreta dele diretamente para o hotel, usada somente nos dias de evento, para ‘retirar de cena’ os protagonistas, sejam cantores ou atores), o Belmond Timeo funciona apenas na alta temporada, permanecendo fechado do meio do outono ao fim do inverno. Então, no começo da primavera, ela vai tomando vida aos poucos. Seus lindos jardins vão renascendo.

Jardins do Grand Hotel Timeo, em Taormina

Piscina do Grand Hotel Timeo, em Taormina

Quem se hospeda lá conta com o transfer para a praia – praticamente particular – do outro hotel da rede, o Belmond Villa Sant’Andrea. Nada mal passar uma tarde estirada ao sol e, ao abrir os olhos, encontrar os azuis do mar quase ao alcance das mãos…

Teatro grego de Taormina: a edificação mais sensacional em que já estive, por duas vezes (e já fui ao Coliseu, Mesquita Azul, Santa Sofia, Notre Dame…). Que sorte.
Construído no século 3 A.C.

Eu, felizona sob o sol da Sicília, comemorando meus 41 anos no Belmond Grand Hotel Timeo

Um dia memorável.

Davide Larise, único chef vegano da Europa com estrela Michelin, dará cursos em São Paulo

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Risoto com aspargos, amêndoas e ervilhas do chef Davide Larise

Chef do único restaurante vegano a ostentar uma estrela Michelin na Europa – o Joia, em Milão -, Davide Larise estará no Brasil entre 10 e 17 de agosto para uma série de cursos. O italiano pertence a Joia Academy, escola de alta gastronomia vegetariana, ao lado de Pietro Leeman e Sauro Ricci.

Davide Larise: único chef vegano com estrela Michelin na Europa dará cursos em São Paulo em agosto

Larise faz algo que considero memorável e digno de palmas: usa a imensa variedade de ervas, verduras, legumes, frutas e castanhas para compor pratos saborosos, complexos, belos e altamente desejáveis. Explora o universo vegetal a fundo, compondo sabores que muitos carnívoros podem considerar impossíveis.

Torta de coco e cenoura de David Larise: chef vegano italiano dará cursos em São Paulo em agosto

Os cursos estão à venda NESTE LINK, custam entre R$ 150 e R$ 200 (cada) e serão ministrados no restaurante Nambu, em Higienópolis.

Módulo I – La Cucina Veg in Italia
Dia 12 de agosto, das 9h30 às 12h30
Caponata di verdure leggera • Risotto allo zafferano • Parmigiana di melanzana • Zuppa: pasta e fagioli
Módulo II –  Pasticceria Italiana
Dia 12 de agosto, das 14h30 às 17h30
Crostata classica • Tartufo bianco di riso e crema di nocciole • Semifreddo agli agrumi • Torta di cocco e carote
Módulo III  – Cereali in Italia
Dia 15 de agosto, das 19h às 22h
Ravioli di grano saraceno • Riso integrale tostato • Cannelloni di mais • Polenta con ragu di verdure
Módulo IV  – Le Proteine Vegetali
Dia 16 de agosto, das 19h às 22h
Insalata di legumi • “Pizza” di ceci • Pate di legumi • Cialde

La Macca: restaurantão de menu amplo aposta nas pastas secas de Gragnano

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Rigatoni com molho de linguiça e tomates e ricota de búfala fresca do La Macca: casa aposta nas pastas de grano duro da cidade italiana de Gragnano

Paulistanos amam cozinha italiana a tal ponto que, mesmo havendo milhares de empreendimentos dedicados a ela na cidade, parece sempre haver espaço para mais um. O novo integrante da ‘turma’ é o La Macca.

Pequena e cara berinjela a parmigiana do novo La Macca: R$ 52

Restaurantão amplo, com muitos garçons, clientela endinheirada e investimento de milhões de reais, o La Macca serve comida de várias regiões do país, tendo parte do grande menu dedicado às massas da cidade de Gragnano. Próxima a Nápoles, Gragnano é conhecida por ser o berço da pastas secas e produzir, até hoje, algumas das melhores do mundo: moldadas em bronze com trigo grano duro, tem maior poder de absorção de molho e mordida deliciosamente al dente.

Risoto perfeitamente cozido, cremoso e encorpado, unia pequenos cubos de abobrinha, queijo robiola e avelãs picadas

Aberto direto das 12hs às 23h30, o La Macca tem cardápio amplo que engloba entradas, massas frescas e secas, saladas, polentas, risotos, carnes, frangos, peixes, panini e tramezini (à tarde) e pizzas (aos domingos). Entre as sugestões, a diminuta berinjela a parmigiana (R$ 52), Tortelini de presunto cru com creme de parmigiano (R$ 62) e Carbonara preparado com espaguete Afeltra (R$ 52).

Fusilli com molho de tomate, burrata fresca e pistache (R$ 54) do La Macca

As pastas Afeltra também marcam presença no Fusilli com molho de tomate, burrata fresca e pistache – que não encontrei no meu prato (R$ 54)-, no Rigatoni com molho de linguiça e tomates e ricota de búfala fresca (R$ 54) e no Linguini com camarões e polvo (R$ 78), entre outros.

Criado pela bartender Adriana Pino para o La Macca, o Chaigroni leva gin infusionado com chai, martini bitter e martini rosso (R$ 31)

Para quem curte a cremosidade adocicada da polenta, há cinco sugestões – ragus de linguiça, cordeiro, ossobuco; lascas de bacalhau com aliche; creme de gorgonzola – a R$ 69, cada.

Tiramisú do La Macca, novo restaurante italiano nos Jardins

Melhor prato da refeição, o risoto perfeitamente cozido, cremoso e encorpado, unia pequenos cubos de abobrinha, queijo robiola e avelãs picadas (R$ 65). Foi acompanhado por um Chaigroni – variação do negroni preparada com gin infusionado com chai (chá indiano condimentado), martini bitter e martini rosso (R$ 31) – da carta criada pela bartender Adriana Pino.

Bom mil folhas do La Macca, novo restaurante nos Jardins

As sobremesas, clássicas, incluem Tiramisú (R$ 29) e bom Mil folhas (R$ 22).

Torta de juçaí cremoso

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Essa torta – paixão a primeira vista! – é de um dos lugares que mais gosto em São Paulo, a Simplesmente, que serve comida 100% baseada em plantas, colorida, deliciosa e saudável.
O que me atraiu neste doce foi o crocante da base, o creme geladinho e sedoso feito de tofu e a cobertura cremosa de juçaí, fruta da Mata Atlântica parente do açaí. Não encontrou juçaí? Substitua por açaí que também fica ótimo.

Ingredientes da base
  • 200g de farinha de sorgo
  • 50g de fécula de batata
  • 100g de açúcar demerara
  • 50ml de óleo de coco
  • 75ml de leite de castanha de caju
Ingredientes do recheio
  • 750g de tofu
  • 300g de polpa de juçaí (ou açaí)
  • 300g de castanha de caju
  • 200g de açúcar demerara
  • 50ml de óleo de coco
Ingredientes da cobertura
  • 200g de polpa de juçaí (ou açaí)
  • 150g de açúcar demerara
  • 300ml de água
Como fazer

Para a base, juntar todos ingrediente em um bowl, primeiro os secos depois os demais e então com as mãos, misturar até obter uma massa homogênea. Adicionar água caso necessário. Untar uma forma redonda com óleo de coco e dispor essa massa sobre a base da forma. Levar ao forno pré-aquecido a 180C por 20minutos ou até que a massa asse por igual.

Para o recheio, deixar as castanhas de caju de molho por 4 horas em água morna, escorrer e então leva-las ao liquidificador e bater com 200ml de água até que fique homogêneo. Adicionar o restante dos ingredientes e voltar a bater no liquidificador até obter um creme liso. Dispor esse creme sobre a base assada da torta e levar ao freezer até firmar (pelo menos 8 horas).

Para a cobertura, basta bater todos ingredientes no liquidificador e levar ao fogo para apurar. Quando em ponto de calda, desligue a panela.

Para servir, retire a torta do freezer pelo menos uns 20 minutos antes de consumir e coloque a cobertura.

Rituaali: um lindo spa (vegano) para limpar a mente e o corpo

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Piscina externa do spa Rituaali, em Penedo: lindas instalações, equipe médica experiente e alimentação vegana

Diminuir o ritmo.
Sair do celular o máximo possível.
Domar a ansiedade.
Entregar-se a pequenos e indispensáveis prazeres negligenciados no cotidiano como ler um livro, fazer massagem, deitar-se ao sol.
Prestar atenção no que se come.
Na quantidade.
E nas razões.
Entender o que os alimentos fazem no e pelo corpo.
Spas bons não são lugares para perder peso: são lugares de reconexão.
O Rituaali é um lugar de reconexão.

Sanduba vegano no spa: ‘burger’ de beterraba e batatas assadas no Rituaali

Eu gosto de spas, assumo. Curto ser paparicada, comer leve, emagrecer e me sentir mais confortável com as roupas e o espelho – minha profissão torna meeeeeio complicado fazer dietas. Já me hospedei nos melhores spas do Brasil – Lapinha e Kurotel – e não sou facilmente impressionável. Por isso digo tranquilamente: o Rituaali é um tremendo destino.

Spa Rituaali, em Penedo: em meio a natureza

Situado em Penedo, bem muito próximo ao Parque Nacional de Itatiaia, o Rituaali abriu há cerca de um ano e meio. Possui vasta e bem cuidada área verde, estrutura impecável – que está sendo ampliada, com construção de mega-horta orgânica, pista de corrida e quadras de esporte -, arquitetura de traços simples e integrados com a paisagem, equipe muitíssimo bem treinada e as melhores massagens que já fiz em spas e hotéis no mundo (e olha que sou a louca da massagem).

Em spa tem sobremesa, sim: cuca de maçã desconstruída. o creme leve leite de soja e a farofinha é de castanha do pará

O foco, porém, não são as instalações, e sim o conceito por trás de tudo: ser um local de reequilíbrio, oferecendo aos hóspedes caminhos para uma vida mais descomplicada e consciente. O maior pilar para isso é, certamente, a alimentação – ali, vegana. De insumos derivados de animais, apenas mel. A razão para isso tem respaldo em dezenas de pesquisas científicas: o consumo regular de carnes e lácteos está intimamente ligado ao aparecimento de doenças como diabetes e câncer. Ser carnívoro não é saudável, não é inevitável, não é a única opção (se você tiver Netflix, por favor, assista aos documentários What The Health e Cowspiracy).

Meu café da manhã no Rituaali: pudim de chia com leite de amêndoas, geleia, pasta de abobrinha, pão sem glúten, biscoito de grão de bico e nozes

Também não entram ali refrigerantes – são PURO lixo – e café ou bebidas cafeinadas, afinal o intuito é relaxar, não ficar ligado no 220V.

Quartos do spa Rituaali: conforto total

A comida é correta, bem temperada – há vários esforços no sentido de melhorar ainda mais o padrão – e ninguém conta calorias. Claro que não dá pra ir ao spa esperando um bufê de hotel fazenda, mas não rola desespero de fome. Mesmo. E nem dá tempo de pensar muito nela: passa-se o dia entre aula de spinning, tratamento facial, aula de alongamento, massagem relaxante, aula de culinária…

Hall da recepção do Rituaali, em Penedo: arquitetura que conversa com o entorno

Piscinas internas e aquecidas do Rituaali: o spa tem um INCRÍVEL serviço de terapias e massagens.

O apoio médico é constante e todo hóspede passa por consultas por clínico, fisioterapeuta, nutricionista e educador físico. Todo hóspede sai de lá com recomendação nutricional e receitas.

Panquecas para o almoço? Tem, sim.

Passei quatro dias no Rituaali com meu marido. Voltei a me exercitar frequentemente (o que mantenho até hoje), emagreci quase três quilos (já se foram mais alguns, desde então), como com mais consciência do que é fome e do que é ansiedade e ‘recheio’ minha geladeira de legumes, frutas, hortaliças, grãos e temperos orgânicos. A decisão de só ingerir carne quanto estou avaliando restaurantes nunca fez tanto sentido pra mim: estou melhor com meu corpo e com minha consciência.

Bons spas são, mesmo, lugares de transformação.

Tuju: quando a alta gastronomia faz sentido

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Lindo, criativo, delicioso: dos meus favoritos no menu de inverno do Tuju. Polvo na brasa laqueado no óleo de caruru-roxo, creme de abacate e kombucha, fava verde no missô de castanha portuguesa e raiz forte ralada

Alta gastronomia passou a fazer pouco, ou nenhum, sentido para mim.
Sim, é uma forma de arte. Maneira de transformar a visão de mundo do chef em bocados apreciáveis pelos sentidos. Mas, ao meu ver, essa arte foi caminhando para um cruzamento entre Romero Britto e pós-modernismo performático: tola, sem alma e petulante.

Entre os meus favoritos do menu degustação de inverno do Tuju: sardinha marinada sobre alcachofra, pão de alho negro e erva doce

Com o crescente importância dos prêmios de best isso e aquilo, a vinda do Michelin pro Brasil, documentários transformando cozinheiros em personagens míticos, a (bizarra) ‘influência’ de foodies de carteiras tão recheadas quanto cabeça oca e o ego de alguns chefs inflando descontroladamente, me aborreci. Esse microcosmo, apesar de continuar contendo profissionais extraordinários, se tornou azedo.

Moti com creme de mangarito e morango fermentado

Em minhas viagens recentes, tenho preterido restaurantes ‘premiados’ por locais em que o chef está presente de alma – e corpo. Bares, tavernas, osterias: o que importa é sentir o amor pelo ofício e não o anseio por um lugar no panteão da gastronomia mundial.

Um dos meus pratos favoritos do menu de inverno do Tuju: Abóbora crocante com abóbora em limão galego, algas, óleo de amêndoas e ouriço

Nesta semana, porém, a alta gastronomia voltou a fazer sentido pra mim. Alta gastronomia como deveria ser: elevação do ingrediente ao seu melhor, inovação aliada a profunda compreensão dos insumos locais, sazonalidade tratada com reverência. Durante as duas horas em que fiquei à mesa do Tuju, provando o novo menu de inverno do chef Ivan Ralston, relembrei a razão de alguns chefs merecerem aplausos.

Peixe do dia, pamonha, folhas leitosas e cogumelos

Ivan é um dos chefs mais talentosos que conheço. Quieto, concentrado, avesso a badalação. Workaholic: nunca deixei de encontrá-lo em sua cozinha, em todas as várias vezes que fui ao Tuju. Ivan consegue ver, com clareza cristalina, as potencialidades não-óbvias dos ingredientes, caso do chuchu cozido em caldo de camarão selvagem, coberto por granita de Noilly Prat, que abre seu menu de 12 etapas (R$ 320). O legume empresta crocância e torna-se um veículo da potência do mar, suavemente mesclada a acidez do vermute.

Do menu de inverno do Tuju: mil folhas de beterraba amarela, iogurte de coco verde, óleo de hortelã e mel de uruçu-amarela

Sua extrema delicadeza na concepção dos pratos – em que nada grita e tudo fala macio – faz uma refeição de doze etapas transcorrer prazerosamente, sem peso. E há coerência. Nada é por acaso. Exemplo é o amplo uso de peixes e frutos do mar: “No inverno a água fica mais fria e a variedade marítima, muito maior. É a melhor época do ano”, diz Ivan. E o mar invade a mesa em composições tão belas… Na sardinha marinada sobre pão de alho negro, no adocicado ouriço sobre abóbora com limão galego, no polvo na brasa acompanhado por favas verdes em missô de castanha-portuguesa.

No menu de inverno do Tuju, esta é a única carne mais vermelha: intenso pombo com banana de terra assada e molho da ave.

E as sobremesas. Que primor.

Refrescante, linda, delicada. Tremenda sobremesa. Parfait de cachaça, sopa fria de manjericão e cítricos de inverno.

Sobremesa daquelas de lembrar para a vida, tamanha a delicadeza e equilíbrio: burrata com paçoca de amendoim envolta em pele de leite, sorbet de morango e azeite

Depois da última mordida no cremoso e defumado bombom de tabaco, que fecha a degustação (faz parte de um quarteto de chocolates que representam os males da sociedade moderna), respirei agradecida: ali, naquele instante, voltei a ver beleza na alta gastronomia.

Maniva: comida reconfortante preparada com ingredientes sustentáveis

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Ótimo frango orgânico salteado na wok com shoyu e legumes do Maniva

O termo ‘sustentabilidade’ é o novo ‘gourmet’: todo mundo usa e pouca gente sabe o que realmente significa. Para esclarecer: comida sustentável é aquela que leva ingredientes produzidos de maneira a impactar minimamente os recursos humanos e naturais, prezando pelo bem estar do solo, da água, dos trabalhadores e dos animais. Pode chamar também de comida com ética. E é comida com ética que serve o pequeno Maniva, com cerca de meio ano de existência.

Coxinha do Maniva: frango orgânico e massa de batata doce

O Maniva tem cardápio conciso, composto por pratos reconfortantes no melhor estilo “comida de casa”. Apesar de não ser vegano, o restaurante usa poucos insumos de origem animal. Quando usa, são orgânicos e/ou sustentáveis, caso da carne bovina e frangos da Korin, cujas reportagens a respeito você pode ler AQUI e AQUI. Esse papo todo de sustentabilidade é bonitinho mas o que te interessa mesmo é o sabor? Vai muito bem, obrigada.

Apenas viciada por completo nessa puta delícia feita com água, gengibre, mel e vinagre de maçã. Potente, picante no fundo da garganta (por conta do gengibre), refrescante.

De segunda à sexta, das 12h às 15hs, o Maniva serve almoço executivo com opções que incluem a gostosa moqueca de pupunha (cozida no ponto, ainda crocante) acompanhada por arroz cateto integral e farofa de banana (R$ 28), frango orgânico grelhado ao molho de caju e cuscuz de painço (R$ 35) e escondidinho de mandioca – que está mais para creme – com ragu de cogumelos (R$ 33).

Moqueca de pupunha (cozida no ponto, ainda crocante) acompanhada por arroz cateto integral e farofa de banana do Maniva, em Higienópolis

A cada dia há uma sugestão: segundas, lasanha de abobrinha ao molho branco de leite de castanha (R$ 32); terças, frango orgânico salteado na work com shoyu, legumes e arroz cateto (R$ 35); quartas, feijoada vegana (R$ 28); quintas, penne à carbonara vegano (R$ 31); sextas, picadinho de carne sustentável com arroz cateto, farofa e ovo (R$ 35).

Coxinha vegana do Maniva: massa de abóbora e grão bico com recheio de cogumelos, é empanada no amaranto e assada

Acompanhe a refeição com kombucha ou, meu preferido, switchel Kiro, bebida potente e refrescante preparada com água, muito gengibre, mel e vinagre de maçã.

Brownie da Leveda Pão à venda no Maniva: delicioso, leve e pouco doce

Para levar pra casa (as geladeiras são abastecidas diariamente com quiches, tortas, pasteis de forno, etc), pedir pelo site ou comer ali no meio da tarde, há coxinha assada de frango orgânico e massa de batata doce. A versão vegana leva massa de abóbora e grão de bico e é recheada com cogumelos.

O pequeno Maniva, em Higienópollis

Na área dos doces – todos com pouco açúcar e fartos em castanhas, cacau e frutas-, pudim de chia (que gosto bastante), torta raw de amêndoas e chocolate e um brownie estupendo da Leveda Pão. Com levain no lugar da farinha de trigo, é leve e muito cremoso.

Uma ótima opção de almoço em Higienópolis. Não abre no jantar.


Mel e a importância vital das abelhas

Oak: um ótimo bar de coquetel dentro de um ótimo bar de cerveja

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Novo Oak: bar de coquetéis funciona no andar superior do Cateto, bar de cervejas especiais

Gosto bem de cerveja. Cerveja boa, claro. Não cerveja cara, obrigatoriamente: cerveja BOA (tem bastante coisa ruim  a preços bizarros). Por isso, o Cateto Pinheiros é um dos meus endereços favoritos na cidade para curtir rótulos que conheço e descobrir novos (o outro é o Âmbar).

Do novo Oak: Soco – Horse & Jockey (Southern Comfort, rum Appleton Estate, Angostura, Carpano clássico, alecrim e cereja, R$ 28) e Oak G&T (bulldog Gin envelhecido em barril de carvalho, tônica, laranja bahia caramelizada com açúcar mascavo e folha de verbena)

Gosto bem de coquetéis. Coquetéis bem feitos, claro. Não obrigatoriamente preparados por bartenders hypados, em endereços cool ou com destilados da moda: gosto de coquetéis BEM FEITOS. Daí que, há algumas semanas, o Cateto Pinheiros abriu um bar de coquetéis no segundo andar do imóvel. Agora, duas coisas que gosto estão no mesmo endereço, separadas apenas por uma escada.

Sanduíche de excelente linguiça de pato com ervas com manteiga de sálvia, no brioche (R$ 25) do Oak, em Pinheiros

O andar superior do sobrado no qual funciona o Cateto Pinheiros foi levemente reformado e transformado no Oak, bar de decoração rusticona, serviço eficiente e carta de coquetéis sem invencionices, bem executados e com amplo uso de bourbon – a marca Wild Turkey é patrocinadora.

O cardápio é dividido em Para Começar – com sugestões mais leves como o Dirty Wet Martini (Bulldog gin, salmoura de picles de pimenta e Noilly Prat, R$ 28) e Amaro e Soda (Amaro Lucano, soda, suco de laranja bahia, R$ 20)-, Whiskey Row – entre as opções, Cateto (Bourbon, Noilly Prat, xarope de agave, amaro Lucano e limão siciliano, R$ 28) -, Velho Mundo – que traz releituras ou execução de coquetéis clássicos como o Black Russian (vodca Skyy, licor de café artesanal e zest de limão, R$ 24), o equilibrado/cítrico/de fundo adocicado Oak G&T (preparado com bulldog Gin envelhecido em barril de carvalho, tônica, laranja bahia caramelizada com açúcar mascavo e folha de verbena, R$ 33) e o Cherry Sparkling (Sloe Gin Oak, xarope de hibisco, espumante, soda e cereja maraschino, R$ 31).

Cherry Sparkling (Sloe Gin Oak, xarope de hibisco, espumante, soda e cereja maraschino) e Rye Sazerac (Wild Turkey de centeio, xarope de mel de laranjeira, bitter oak, angostura e spray de absinto) do novo Oak

Há também uma pequena homenagem às bebidas de botequim como o Maria Mole (Jerez Fundador, Noilly Prato, Angostura de laranja e xarope de gengibre, R$ 26) e o Porquinho (cachaça Armazém Vieira infusionada no bacon, suco de laranja bahia, Carpano Clássico e angostura, R$ 26)

Para acompanhar os drinques do Oak há pequena e boa seleção de salumeria e tostadas como a de legumes assados, ricota de búfala e castanha de cajú

Meu favorito da visita foi o Rye Sazerac (Wild Turkey de centeio, xarope de mel de laranjeira, bitter oak, Angostura e spray de absinto, R$ 39), servido resfriado em copo baixo

Para comer é possível pedir as tábuas de queijos e embutidos artesanais do Cateto, sanduíches (como o de excelente linguiça de pato com ervas com manteiga de sálvia, no brioche, R$ 25) e tostadas.

Entrou na lista dos meus preferidos.

Abelhas sem ferrão, mel, geleia real, própolis: afinal, o que é tudo isso?

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Abelhas são um dos animais mais importantes do planeta – e não por que produzem mel. Por mais prazeroso que seja o viscoso e doce líquido, ele não é a razão pela qual precisamos cuidar muito, muito bem das abelhas. A principal razão é: nossa comida depende da existência delas.

Cerca de 80% da polinização de todas as plantas do planeta é feita pelas abelhas. Enquanto grãos são primordialmente polinizados pelo vento, frutas, nozes e vegetais são polinizados por elas. De quinze anos para cá, porém, a população de abelhas vem diminuindo drasticamente em todos os pontos do globo – as principais razões são o uso excessivo de agrotóxicos e a propagação de imensas monoculturas, que destroem seu habitat natural. Este fenômeno foi batizado de colony collapse disorder (síndrome do colapso da colônia). 

O fato é: sem abelhas, o mundo sofrerá com escassez de alimentos e surtos de fome de proporções catastróficas.
Para saber mais sobre o tema, clique AQUI e AQUI

Para entender sobre esses insetos primordiais à vida, visitamos a Fazenda Itaicá, da marca MBee Mel de Terroir. Situada na Serra da Bocaina, a Fazenda Itaicá conta tanto com criação abelhas africanas (também conhecidas como europeias e italianas) – aquelas com listrinhas pretas e amarelas) quanto de abelhas nativas (sem ferrão).

E, vou dizer, os meles das mais de trezentas espécies de ‘abelhas mansas’ são infinitamente mais interessantes gastronomicamente. Meles que, por sua vez, também estão ‘entrando em extinção’: o desconhecimento por parte do público, e o consequentemente não-consumo, faz com que cada vez menos gente se interesse em produzi-los. Eu os considero uma iguaria, assim como trufas e caviar.

Então, comecemos pelo começo:

Colmeia de abelha nativa, também chamada de mansa e sem ferrão: as mais de 300 variedades produzem meles magníficos

O que é mel?

O mel é o alimento principal das abelhas. Os grãos de pólen, retirados das flores, são suplementos. Quando extraímos mel para consumo humano, estamos tirando comida da colmeia – da mesma forma que acontece com leite em vacas, ovelhas, cabras. Por isso há que existir bom senso e boas práticas de manejo.

Como abelhas produzem mel?

O néctar coletado das flores pelas abelhas operárias – néctar é uma solução de açúcares com água, produzida pelas flores – é transportado para o enxame, maturado, concentrado e transformado em mel. Inicialmente, as abelhas operárias armazenam o néctar coletado em sua vesícula melífera (papo de mel) localizada ao lado do estômago e o transportam até o enxame. Então, o repassam para outra abelha operária, boca a boca. Nesta ocasião, ocorre a reação enzimática do organismo da abelha operária, a sacarose, que é a principal substância do néctar e que é transformado em frutose e dextrose. As abelhas operárias que receberam o néctar transportam-no para armazenar na melgueira e produzem vento, batendo suas asas, a fim de evaporar a umidade. A  temperatura de 34 graus no interior da colmeia também acelera a concentração e a maturação do mel. As melgueira com mel maturado são fechadas com a cera.
(texto adaptado do site
Yamada Bee Farm).

Qual o papel do pólen?

Ele é o principal produto não-líquido da dieta das abelhas, e é à partir de sua obtenção que elas elaboram a geléia real, alimento da rainha. No momento em que as abelhas operárias mergulham no interior da flor em busca do néctar, os grão de pólen agarram nas penugens que envolvem seu corpo. Ao irem de uma à outra, “deixam” alguns grãos, o que causa a polinização das plantas.

O pólen que resta nas abelhas é umedecido com néctar, levado para a colmeia, triturado e guardado no fundo do enxame para futuro consumo.

Larva da abelha rainha sendo alimentada com geleia real

O que é geleia real?

É o alimento exclusivo da abelha rainha. Na verdade, é alimentando uma larva comum exclusivamente com geleia real que ela se tornará rainha.

A geleia real é preparada com o pólen armazenado no fundo do enxame misturado a secreção glandular das abelhas operárias. O resultado é um superalimento: por conta dela, a abelha rainha – que come geleia real desde sua fase de larva – terá até três vezes o tamanho de uma abelha operária. A alimentação também impacta outros aspectos: enquanto as operárias vivem entre 30 e 45 dias, a rainha vive cerca de 4 anos.

Ao contrário do mel, a geleia real não é palatável aos humanos.

Manejo de abelhas europeias na fazenda da MBee Mel de Terroir

E o que é própolis?

Algumas árvores encontradas na natureza produzem um tipo de resina com propriedades antibacterianas e antifúngicas que protegem o vegetal do ataque de insetos e fungos. Ao coletarem essa resina, as abelhas a levam para a colmeia. Lá, será misturada à cera e também a secreções salivares, formando a própolis, substância rica em antioxidantes.

Na colmeia, a própolis é utilizada no preenchimento de espaços, como falhas e rachaduras, que podem servir de entrada ao frio e também a predadores; para embalsamar insetos ou outras abelhas intrusas que porventura entrem na colmeia; e também para recobrir as células que guardarão os ovos colocados pela rainha. A própolis tem uma função muito importante na colmeia: elimina micro-organismos e outros agentes infecciosos.

Meles de abelhas nativas: para mim, uma iguaria tão incrível como trufas ou caviar

O que são abelhas sem ferrão?

Jupará, Jandaíra, Jandaíra-Preta, Uruçu-Boca-de-Renda, Mandaçaia, Guarupú, Guaraipo,Monduri, Rajada,Tiúba, Jataí: já ouviu falar de alguma delas? Pois as abelhas nativas eram as grandes estrelas por aqui antes da chegada da Apis mellifera – aquelas abelhas de listras amarelas e pretas-  no continente americano. Na era pré produção de açúcar, o mel das abelhas nativas era o principal adoçante natural e fonte de energia indispensável aos humanos.

As abelhas sem ferrão, ou meliponíneos, ocorrem em grande parte das regiões tropicais da Terra, ocupando praticamente toda a América Latina e África, além do sudeste asiático e norte da Austrália. Mas é nas Américas que grande parte da diversidade de espécies ocorre: são aproximadamente 400 tipos descritos.

Porque acabaram relegadas a segundo plano?  Principalmente por produzirem menos mel que as europeias. Por darem menos lucro, basicamente. Enquanto uma colmeia de apis mellifera – ou abelhas europeias – chega a produzir 40 kg de mel em um ano, as nativas dão, em média, 300 ml…

Quais as diferenças sensoriais de meles de abelhas europeias e nativas/sem ferrão?

Antes de tudo, é bom entender que o sabor e qualidade do mel vai depender de alguns fatores: alimentação e espécie da abelha. Alimentação, aqui, é um tema bem importante porque está ligado a biodiversidade – quantos maior a variedade de plantas de uma região, mais rica será a alimentação da colmeia e, portanto, mais sensorialmente interessante será o mel. Além disso, o bioma deve conter árvores que tenham floradas em diferentes épocas do ano para que as abelhas sempre tenham alimento (o que alguns produtores fazem é manter meia dúzia de árvores e ‘complementar’ a alimentação da colmeia no inverno com xarope de açúcar invertido…).

Em se tratando de espécie, posso dizer por experiência: em termos de descoberta de sabores, nada se compara a uma degustação de meles de abelhas nativas. Cada um deles tem notas próprias, completamente distintas.Um tesouro gastronômico que está logo aqui, no nosso quintal – mas corre risco de desaparecer se não dermos o devido valor.

Hotel Arpoador reabre com curadoria gastronômica – e restaurante – de Roberta Sudbrack

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Roberta Sudbrack: a chef será responsável pela gastronomia do Hotel Arpoador, no Rio

Em janeiro deste ano, uma das chefs mais respeitadas do país, Roberta Sudbrack, fechou seu restaurante de alta gastronomia no Rio de Janeiro, o RS: “Os chefs transformaram a alta gastronomia em algo cansativo, e eu me incluo nisso. Evoluímos enormemente na cozinha mas esquecemos de trazer a brasilidade para o serviço. O ritual ficou muito chato”. A notícia pegou muita gente de surpresa, especialmente aqueles que veem estrelas Michelin como a única medida de sucesso: ela possuía uma e isso não deteve sua decisão.

Projeto de renovação do Hotel Arpoador

Em entrevista a mim, em fevereiro, Roberta desabafou: “Com todo respeito ao Michelin, abrir mão dessa estrela foi o que menos doeu. O que mais doeu foi tirar minha cozinha do lugar. Não fechei só um restaurante, fechei um lugar que tem importância pra mim e também para a gastronomia brasileira”.

Quais serão os próximos passos da chef? Segunda ela mesma: “Quero coisas que me conectem profundamente com o que penso ser a essência do cozinheiro: fazer feliz para ser feliz”. Essa felicidade inclui seu novo restaurante, a ser inaugurado em breve no Jardim Botânico – bem diferente do RS, contará com um grande forno a lenha integrado ao salão e comida afetiva – e a curadoria gastronômica e assinatura do menu do restaurante do Hotel Arpoador, que passa por grande remodelação e será reaberto em novembro. 

Após remodelação, Hotel Arpoador terá gastronomia sob comando da chef Roberta Sudbrack

A pegada do cardápio do Arpoador fica clara nas palavras da chef: “Comida fresca, simples e descontraída – com o mar como ponto central -, que envolva serviço de quarto, bar, café da manhã, praia, piscina, almoço, jantar e hospitalidade“.

Por que, mesmo com tantos convites ao longo da carreira para assumir restaurantes de hotéis, aceitou este específico? “O Arpoador é um ícone carioca, um hotel intimista, de gestão familiar extremante preocupada com conceito e  qualidade. Para mim, veio no momento certo, no qual queria me expressar com mais liberdade mas em conexão com a qualidade, a excelência e os ingredientes brasileiros, que sempre foram alicerces do meu trabalho. A curadoria é uma oportunidade de fazer coisas que eu sempre acreditei, mas em outros formatos.”

Umami preguiçoso: o mito da excelência paulistana em comida japonesa

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Escrever sobre a forma como enxergo a cozinha japonesa sem entrar em conflito com ideias que não concordo, ou que acredito serem um fracasso, é sempre um desafio. Por mais delicado que seja, é preciso falar sobre as influências que a cozinha clássica vem sofrendo e também sobre o fato de que muitas pessoas falam sobre comida japonesa sem ao menos ter estudado o assunto. 
Um ponto simples e importante, é estudar sobre base. Um exemplo? Umami.

Há algum tempo, tem se falado muito sobre umami. Qualquer profissional envolvido com alimentação ou pessoa que se interessa pelo assunto já deve ter falado ou escutado sobre isso em algum momento. De maneira geral, umami é a palavra que representa o quinto sabor básico que somos capazes de identificar. O nome científico que damos a este sal derivado do ácido glutâmico, um aminoácido, é Glutamato Monossódico (MSG ou GMS).

Este aminoácido está presente em muitos alimentos na natureza e também pode ser obtido artificialmente através da fermentação da cana de açúcar e outros produtos ricos em açúcares, como a beterraba. O produto artificial mais conhecido é o Ajinomoto.

A indústria de alimentos se beneficia bastante do Glutamato Monossódico para condicionar um consumo maior de produtos industrializados: um dos efeitos notáveis do glutamato artificial é realçar os sabores dos alimentos enquanto cria intensa sensação de prazer e suprime as funções hormonais da leptina que, por sua vez, deveriam dizer ao cérebro quando parar de comer.

Estudos indicam o alto consumo de produtos industrializados e fast food como uma das principais causas da obesidade na atualidade. A Ajinomoto nega e faz esforços tremendos para mostrar ao mundo que seu produto, tão lucrativo, é um benefício e não um problema para a saúde mundial. Difícil de acreditar quando ela abastece indústrias e redes de fast food no mundo inteiro. Pela fama do Ajinomoto, muita gente pensa que o umami é uma exclusividade dos japoneses e que isso é a base da sua cozinha.

A base da cozinha japonesa não é o umami.

A base da cozinha japonesa (e de qualquer outra cozinha) é a capacidade de entender o meio ambiente e os ingredientes individualmente e assim, aproveitar ao máximo o que cada um deles pode nos oferecer da maneira mais natural e harmônica possível. O Umami é apenas uma das peças que encontramos dentro deste processo. O que quero dizer com natural e harmônica?

Imagine um tomate. Imagine que ele surgiu de uma semente que caiu no meio de um pedaço de terra intocado por nós, humanos. Este tomate vai nascer e sobreviver sem a nossa ajuda. Ele retira tudo que precisa da natureza. 

Agora, morda este tomate. Consegue descrever o seu sabor? Difícil, não?

Agora, pense no que ele te causaria uma vez que estivesse na sua boca. O que este tomate te faria sentir? Pois é.

Essa surpresa, seguida da sensação de comer algo delicioso e que preenche as papilas gustativas, esse pequeno e breve momento de felicidade, é o que gosto de chamar de umami. Na minha própria maneira de ver e interpretar as coisas, o umami é uma sensação e não um sabor elementar como o salgado, o azedo, o doce e o amargo. Até porque, se você procurasse um pouco mais na sua boca, encontraria estes quatro sabores numa única mordida neste tomate. 

E se você adicionasse glutamato monossódico artificial a este tomate? O que aconteceria?

 Ele deixaria de ser um fruto e passaria a ser um produto. Então, é possível afirmar que ele passaria a ter a mesma qualidade de um tomate cultivado em larga escala.

Um adulto que passou a infância comendo salada de tomate de má qualidade e Ajinomoto, por exemplo, ao comer este tomate, diria que é sem graça e sem gosto. A incapacidade de compreender o que um tomate sem aditivos pode nos dizer, é a nossa triste realidade.

 Então, antes de falar sobre umami, e surfar na onda da cozinha japonesa que muitas pessoas sérias acreditam e vêm dedicando suas vidas, precisamos falar da deficiência que a falta de informação e conhecimento causa no paladar e na qualidade da alimentação das pessoas. Esta falta nos leva à cozinha japonesa popular atual que cresceu com jovens sem conhecimento e comendo muito mal.

 Um fator muito importante que deve ser levado em conta, foi a carência de pessoas exemplares para que eles pudessem seguir. Temos safras inteiras de profissionais que cresceram órfãos de referências boas. Seus exemplos são formatos sabidamente falidos de gestão, péssima manipulação dos alimentos e falta de profissionalismo. Cresceram sem treinamento especializado, sem acesso à informação (porque não quiseram: internet barata já existe há muito tempo) e acabaram marginalizados por conta da quantidade de restaurantes que abriram sem as mínimas condições de operação e investidores despreparados. Apesar de todos os pontos favoráveis como a acessibilidade da comida japonesa para um maior número de pessoas, criou-se um fluxo de profissionais e de alimentos de péssima qualidade.

 Os empresários não são os únicos responsáveis por esse cenário desastroso. Quem atua também é. Muitos ganharam dinheiro surfando nessa onda e se acomodaram sem ao menos ter estudado mais.

 Alguns chefs de cozinha japonesa que já são consagrados poderiam ter contribuído muito mais e de maneira mais eficaz se não tivessem perdido tanto tempo preocupados com prêmios, dinheiro e ego quando estavam no auge de suas carreiras. Muitos deles poderiam ter feito muitas coisas boas pelas gerações seguintes.

 O que vi ao longo dos anos que me dedico à cozinha e cultura japonesa, vai desde moedor de carne para triturar peixes, sushi e tempurá de chocolate, dono de restaurante famoso da Rua Bandeira Paulista me dizendo que tinha de dar graças à Deus pela oportunidade de trabalhar para ele, um telefonema absurdo que recebi de um chef me dizendo para abrir mão dos meus ideais e ceder para produtos como azeite trufado e foie gras em troca de uma vida mais tranquila, até um desaforado que me ofereceu o seu restaurante com desdém porque ia abrir um restaurante em NY. Não abriu ainda. Mas torço de verdade para que consiga, um dia. 

 Quando era jovem nenhum deles sequer trocou uma palavra comigo. Hoje em dia, não sei de onde tiram  a liberdade de me dar conselhos como se tivessem, de alguma forma, ajudado a chegar onde cheguei. 

 A verdade é que a maioria dos profissionais em ascensão ou com mais bagagem e conhecimento que podem mudar as gerações futuras agora, não estão em atividade no Brasil ou estão em atividade no País mas se formaram no estrangeiro. Esses indivíduos não saíram de casas badaladas do Itaim Bibi. Alguns deles não saíram do país, mas foram treinados em um regime totalmente diferente do padrão nacional e têm contribuído incansavelmente também.

 Saí cedo do Brasil porque não encontrei a qualidade que considero ideal em nenhum dos restaurantes que passei. Muito menos o suporte profissional, uma gestão competente e alguém que julgasse bom o suficiente para me espelhar. Voltar para o Brasil após a primeira saída foi pior ainda. Depois de passar uma temporada em Tóquio, esperava ter feito a escolha certa ao aceitar um cargo em um dos restaurantes mais importantes do Brasil na época.

 Ali, vi salmão selado no maçarico com manteiga trufada e sashimi de salmão com flocos de tempura e balsâmico. Mesmo assim, esse restaurante carrega hoje uma estrela no guia Michelin servindo ainda os mesmos pratos que citei, num dos menus mais caros do Brasil. Como um restaurante estrelado serve a mesma comida por tanto tempo? É muita falta de respeito e cuidado com as pessoas que se deslocam até ali buscando algo surpreendente.

 Cansei. Saí de novo. Voltei. Saí de novo. E na minha opinião, as coisas só continuam piorando.

 Hoje vemos restaurantes que se dizem japoneses preparando arroz de péssima qualidade, que cheiram azedo, que servem molho de soja e milho transgênicos, caldos e ceviches com base de hondashi (caldo de peixe industrializado), salmão chileno, o duvidoso salmão selvagem do Alaska (que solta pigmentos durante o descongelamento), peixe-prego ou agulhão, cream cheese, sriracha, tabasco, batata palha, doritos e afins, azeite trufado e foie gras de larga produção sem os devidos processos de retirada de excesso de gordura e sangue. Sem falar de tantos e tantos termos erradamente ensinados às pessoas como o pleonasmo criado pelo termo “molho-tarê”. Para quem não sabe, tarê significa molho, em japonês. Portanto, redundante.

 Sushimen de restaurantes badalados, antes mesmo de fazer vôo solo e abrirem casas tão ruins como as que trabalhavam, ensinaram a centenas de comensais absurdos como “Masago são ovas de peixe voador”. Na realidade, são de capelin. Um peixe que é conhecido como shishamo no Japão e muito apreciado grelhado quando está carregando as suas ovas. O termo correto para ovas de peixe voador é Tobiko ou Tobikko.

Esses mesmos restaurantes servem sobremesas como tempura de sorvete, banana flambada, mochi com sorvete industrializado, carpaccio de polvo com curry e alcaparra e até brigadeiro de colher ou queijo coalho com mel trufado. A lista de produtos não para aí e a lista de restaurantes “autênticos” que vivem disso é ainda mais preocupante.

Durante os últimos dois anos de Brasil, tentei mudar um pouco as coisas aplicando uma metodologia mais institucionalizada e profissional estrangeira na gestão. Fiz como pude e acredito ter feito a coisa certa ao deixar a sociedade no começo deste ano para seguir com o que realmente quero fazer. Hoje, nem um ano após deixar a gestão nas mãos dos meus antigos sócios, o restaurante está fechado para mudanças e não tem data para reabrir. O que saiu do UN comigo, sempre esteve e vai estar comigo. Não é um nome ou uma empresa. É um estilo de vida e uma forma pessoal de enxergar as coisas. É uma filosofia. Se conseguirmos mudar, mesmo que um pouco, as pessoas ao nosso redor, é possível dar alguns passos em direção a um futuro mais profissionalizado e com pessoas interessadas e prontas para fazer a coisa certa.

 Desde que comecei a cozinhar e entender que teria que fazer as escolhas certas, pago um preço alto por dizer sempre a verdade. Mas vivo todos os dias a mesma sensação gostosa que aquele tomate nos dá. E esta, senhores, é a sensação de ser livre e autêntico aos meus ideais e de muitos que tentaram e ainda tentam, mas não tiveram suas vozes ouvidas no meio de tanto ruído ou que não podiam fazer a escolha que fiz. Eu escolhi viver de acordo com o que acredito não importando as consequências. Eu assumi essa responsabilidade.

Este, senhores, é o meu Umami. A sensação única do sabor de poder ser quem sou e decidir quem respeito ou não ao longo deste caminho. E o seu?

 Guiri*. Sempre!

 

*Do japonês: Honra, senso de dever, decência, cortesia, gratidão, obrigação.

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